"Bom mesmo é ir a luta com determinação, abraçar a vida com paixão, perder com classe e vencer com ousadia. Pois o triunfo pertence a quem se atreve... a vida é 'muito', para ser insignificante". Charles Chaplin.



sábado, 1 de abril de 2017

Um Reino tão, tão perto!

Elivane Secchi – Coordenadora Regional do SINTE de Palmitos e Secretária de Políticas Sociais da CUT-SC

Era uma vez um Reino chamado Tão, Tão Perto. Neste Reino viviam muitas pessoas; pessoas que trabalhavam muito. Claro que algumas trabalhavam pelo bem comum, outras trabalhavam só em benefício próprio. 
Neste Reino aconteciam muitas coisas boas, havia uma belíssima festa chamada carnaval, onde todos os que gostavam da folia podiam participar. Ali não havia distinção de raça, cor, gênero, classe social, opção política, religiosa ou sexual. Todos se divertiam livremente.
Havia também outra paixão: o futebol. Era cultural no Reino, o esporte, e todos amavam o futebol. Claro, havia desavenças, quando times rivais se confrontavam, muitas vezes a violência chegava a ser tanta que até aconteciam mortes. Uma única seleção unia a todos, numa mesma paixão, numa mesma batida de coração. Mas, neste Reino, no dia a dia, na sociedade, havia muitos problemas, diferenças de todos os tipos, preconceitos, desigualdade social, má distribuição de renda, violência, desvalorização da educação e do profissional, poucos ricos e muitos pobres. 
Até que um dia por um GOLPE, apoiado pela grande mídia, por parte do Judiciário e por um Congresso que não representava o povo como deveria, um tirano assume o Reinado e começa a retirar, um a um, com muita habilidade e rapidez, direitos fundamentais dos trabalhadores, direitos estes conquistados com muita união, com muita força, muito sangue de homens e mulheres tombados na luta no decorrer da história. Então, trabalhadoras e trabalhadores do Reino inconformados/as e indignados/as com tamanha leviandade e descaso do Rei saíram às ruas chamando todas as pessoas que ali viviam para se mobilizarem e impedirem que o pior acontecesse. Os protestos foram organizados em Atos por todo o Reino. Foi lindo! Nos dias de Ato milhões de trabalhadores saíram às ruas empunhando suas bandeiras (geralmente de cor vermelha – que é símbolo de luta), cantando e proferindo gritos de ordem, como: Nenhum direito a menos! Abaixo a PEC da Morte! Não à Terceirização da mão de obra! Não à Reforma do Ensino Médio (sem discussão nenhuma com a sociedade)! Não à Escola Sem Partido! Não à Reforma da Previdência, que faz o trabalhador e a trabalhadora trabalharem até a morte! Enfim, o povo do Reino Tão, Tão Perto tinha muitos motivos para saírem às ruas e protestar. E essas reformas eram assunto de toda a sociedade - nas padarias, nos supermercados, nos pontos de ônibus, nos pontos de táxi, nas portas das fábricas, nas praças, nas casas das pessoas, até entre os adolescentes.
Porém, como toda a história tem um porém, em muitos locais de trabalho não se falava nisso, e os que tentavam chamar seus colegas para que fossem à luta não eram ouvidos, eram ignorados ou simplesmente lhes viravam às costas. Sabem que lugar era esse caros leitores? Peço licença para abrir parênteses (não dá para generalizar, mas garanto são muitos) - fecha parênteses, e continuamos. Vou refazer a pergunta: Sabem que lugar era esse? Pasmem, esse lugar era a escola! Vocês me perguntariam: A escola? Mas não é a escola que tem a obrigação de abrir os olhos da sociedade? Não é a escola que tem a obrigação de formar cidadãos e cidadãs críticos/as? Não é a escola que deveria estar à frente das grandes mobilizações para chamar o povo às ruas? Sim, eu particularmente concordo com vocês, leitores. Mas, como já frisei, sem generalizar, muitos professores das escolas do Reino se furtaram em ir à luta, aliás, se furtaram até mesmo de saber de fato sobre os acontecimentos. Os que tentavam esclarecer o que vinha acontecendo não eram bem-vindos às conversas de grupos de professores. Alguns, inclusive, que lutaram uma vida inteira, em nome de uma categoria, foram desrespeitados pelos seus colegas “superiores” no final de sua carreira, com alegações do tipo: “Você tem argumentos, e não há como discutir com quem tem argumentos, mas seu tom de voz faz com que você perca o respeito”. Isso era ingratidão, desrespeito a quem passou uma vida inteira dedicada ao bem comum. Mas é caso para outra história.
Pois bem, continuando, quando as escolas eram visitadas por seus representantes, aqueles que enfrentavam os governos, sem medo de desconto, faltas ou repressão, (isso quando não eram impedidos de adentrar a sala dos professores) para falar sobre direitos da categoria, direitos dos trabalhadores, ou ouviam dos colegas um profundo silêncio que chegava doer os ouvidos e a alma, ou ouviam críticas sobre a entidade sindical que sempre defendeu a categoria, ou, algumas vezes, tinham perguntas que interessavam somente a um único indivíduo, longe do coletivo. Mas quando vinha a pergunta: E então colegas: Vamos à luta? Vamos às ruas? Vamos paralisar nossos trabalhos? Neste momento, o silêncio gritava ainda mais alto, e vinha acompanhado de expressões faciais que podiam ser lidas como: “Vão vocês, bando de desocupados”! “Voltem ao Sindicato (Sindicato???? quem seria este personagem???)! Já perdemos muito, agora chega”!… E os representantes da classe trabalhadora da educação saíam das escolas com aperto no peito e nó na garganta, esbravejavam internamente, ou com alguém que estivesse acompanhando. Mas, quando chegavam do lado de fora, olhavam para o sol, respiravam, e diziam: “Vamos em frente! A luta não pode parar!...
Mas esses dirigentes tinham também outras decepções, ouviam nas salas de professores das escolas em que atuavam, discussões como: “De onde saiu a ordem de que o professor precisa fechar as janelas da sala de aula, quando sua aula acabar, ou no final do turno?” Caro leitor, o Reino pegando fogo, e a discussão se resumia em quem devia fechar ou não fechar, uma janela!!
Outro caso, alunos de determinada escola ouviam em casa, na rua, nas conversas com amigos, no facebook, sobre os acontecimentos, e decidiram entrar na luta contra isso, resolveram ir às ruas, informar a população sobre as inúmeras injustiças que estavam sendo feitas, levaram a ideia à escola, solicitaram materiais explicativos e.... nenhum professor assumiu a responsabilidade de orientá-los, acompanhá-los, incentivá-los (…).
Só mais um caso para completar esta historinha, que, rapidamente me dei ao trabalho de escrever, mesmo sabendo que muitos não lerão, afinal, passa de duas páginas:
O Rei do Estado, não o Rei maior da Nação, instituiu o “Dia da Família na Escola”. Preciso, mais uma vez, abrir parênteses (que bela iniciativa senhor Rei, família na escola sempre é importante). Opa, você, leitor/a, deve estar imaginando: Claro, aproveitaram este momento efervescente para discutir com a população, explicar aos que ainda não estavam por dentro sobre o que vinha acontecendo, criar junto com a comunidade escolar uma frente contra a retirada de direitos, organizar junto com a comunidade uma paralisação marcada, na época, para o dia 28 de abril daquele ano, momento que todo o Reino deveria parar... Aí, você me pergunta: Foi isso que aconteceu, não foi???
Caro leitor, talvez, em algumas poucas unidades escolares este assunto tenha sido abordado, mas nem de longe este assunto pairou entre as unidades escolares como prioridade, como necessidade daquele momento. Infelizmente, outros foram os assuntos tratados na maioria das escolas, todos pertinentes, com certeza, mas nenhum que encorajasse a sociedade a ir à luta. 
E assim seguiu o povo do Reino Tão, Tão Perto… Para onde?… Ninguém sabe. A história (ainda) não acabou. Todos continuamos protagonistas. Sujeitos de mudança, ou de acomodação, sem direito a reclamar depois.

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